11.10.06

Novo artigo Jornal da Manhã - Publicado em 08/10/2006


A SIMPLICIDADE ERUDITA DE ROGER CHARTIER

No último dia 28 de setembro, estive, juntamente com outros colegas historiadores, na Universidade Federal de Uberlândia a fim de ouvir uma palestra, intitulada A Nova História Cultural, proferida por um dos mais importantes historiadores da atualidade: o francês Roger Chartier. Entre outras ocupações, o professor Chartier é diretor da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais, em Paris, onde leciona disciplinas relacionadas com a história das práticas culturais e história da leitura. O seu seminal artigo O Mundo como Representação – além de outras obras – abriram novas possibilidades no campo historiográfico, especialmente aqueles ligados à história cultural.

Apenas para situar, de forma muito breve, a história cultural é uma maneira de se escrever a história que leva em conta uma especial afeição pelo informal e apresenta caminhos alternativos para a investigação histórica, indo onde as abordagens tradicionais não foram. Nessa forma de se escrever a história, são deixadas de lado interpretações generalistas e globalizantes. Para tanto, nos aconselha Roger Chartier, o historiador da cultura deve entender as manifestações culturais como prática, e sugere para seu entendimento os conceitos de Representação e Apropriação.

A Representação seria analisar as ausências por intermédio de práticas simbólicas, uma vez que o ausente em-si não pode mais ser visitado. Segundo Sandra Pesavento, historiadora que comenta a obra de Chartier, “representar é estar no lugar de; é a presentificação de um ausente; é um apresentar de novo, que dá a ver uma ausência”. Já a Apropriação seria a tentativa de construir uma história social, remetida para suas determinações fundamentais, que são o social, o institucional e, sobretudo, o cultural. A história local, enquanto corrente historiográfica, só tem sido possível por conta dos avanços da história cultural.

Mas vamos voltar ao nosso encontro com Roger Chartier. Ao chegarmos ao anfiteatro, fomos surpreendidos com o fato de que a palestra seria proferida em português, não sendo necessário haver tradução simultânea. Interessante observar que, na maioria das vezes, os palestrantes que por aqui nos visitam, não se preocupam, nem um pouco, com isso.

Aos nos acomodarmos nas poltronas, outra surpresa: de repente um senhor na casa dos 60 anos (confesso que o julgava bem mais velho), extremamente sorridente, acenando para os presentes, senta-se na mesa central e passa a autografar, pacientemente, seus livros e deixar que as pessoas lhe tirassem fotografias. Além de conversar amigavelmente com todos a sua volta.
Sua palestra, onde procurou traçar um histórico das principais correntes da história cultural, primou pela erudição e pela precisão ao usar conceitos até certo ponto bastante complexos para serem abordados em falas breves como são as palestras. Entrementes, a simplicidade de sua postura foi traço marcante durante toda sua exposição. Ao final, respondeu a todas as perguntas que lhe foram encaminhadas.

Entretanto, o mundo acadêmico, freqüentado por ilustres professores, mestre e doutores, não é dado a simplicidades. Ao contrário: a vaidade e a empáfia são suas principais características. No encontro com Roger Chartier, aprendemos bastante sobre metodologia da história. Mas também tivemos a oportunidade de aprender algo que muito tem feito falta aos nossos intelectuais e aos ambientes por eles freqüentados: que ser simples e simpático não afeta o rigor das nossas análises nem nos torna menos competentes.

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