23.1.09

Novo Artigo Publicado em 14/02/2007

DORA DOIDA, “SEU” MARCOS E ZOTE

Que Rui Barbosa me perdoe, mas acho que nossa principal praça deveria se chamar praça Dora Doida.

Nada sei, de concreto, sobre ela. Não sei quantos anos tem, se gosta dessa ou daquela comida, se mora nesse ou naquele bairro, se torce por algum time de futebol. Nem viva sei se está. Entretanto, sua figura desperta em mim profundo fascínio. Se me perguntarem qual a primeira pessoa que me vem à mente quando penso em nossa cidade, digo na hora: Dora Doida. No meu imaginário, ela é muito mais famosa e importante do que o Águia de Haia.

Estive, pessoalmente, com ela em pouquíssimos momentos, quando trabalhava na livraria Alternativa. Ela entrava na loja, perguntava se algum rapaz queria casar com ela e ia embora. Dizem que, vez ou outra, era agressiva. Pode até ser. Na minha presença, nunca o fora. Depois, a vi andando pelas ruas algumas vezes.

Getúlio Vargas é outro que não pode ficar bravo comigo, mas o logradouro que leva seu nome também deveria mudar. Deveria passar a se chamar “Seu” Marcos.
Também sobre “Seu” Marcos sei muito pouco. Apenas que vende filtros purificadores. Mas sua figura é singular: por onde anda, é acompanhado por inúmeros cachorros. Certa feita contei mais de doze. Toda a cidade o conhece. Já tentei entrevista-lo, mas ele sempre foge. Acha que não tem nada a dizer. Eu, ao contrário, acho que ele tem tudo a dizer. Nesse breve encontro, consegui arrancar pouquíssimas informações. Sobre os cachorros, diz apenas que gosta de cuidar deles. Propus-me até a comprar dele um purificador na intenção de ter mais tempo para conversarmos, mas não teve jeito.

Agora é a vez dos torcedores do intrépido Nacional Futebol Clube não ficarem bravos comigo, mas acho que o nome do campo da agremiação deveria mudar de JK para Zote. Não sei nem se ele gostava de futebol e muito menos se torcia pelo Nacional. Entretanto, a figura do Zote me chama muito mais atenção do que a do ex-presidente. Dias atrás, João Sabino se referiu a ele num de seus textos, neste mesmo Jornal da Manhã.

O que mais chama atenção na figura do Zote é que todo mundo tem sempre uma história para contar sobre ele. As mais famosas giram ao redor de seus carros. Não há quem não conheça aquela em que ele se dirige à concessionária para adquirir um carro novo e, devido a sua parca vestimenta, nenhum vendedor lhe dá atenção, julgando-o incapaz de comprar um bem tão caro. Eis, então, que, de repente, ele saca uma enorme quantidade de notas e, à vista, arremata o modelo mais caro.

Quando começo a pensar nas pessoas, reais ou imaginárias, as quais nossa cidade me traz à lembrança, não consigo deixar de pensar na Dora Doida, no “Seu” Marcos e no Zote. É claro que Rui Barbosa, Getúlio Vargas e JK merecem o respeito de todos nós. Mas esses três singulares personagens estão muito mais impregnados na memória coletiva da cidade. Isso é facilmente explicado se levarmos em conta que é muito mais fácil nos identificarmos com as coisas que estão ao nosso redor do que com aquelas mais distantes.

Dora Doida, “Seu” Marcos e Zote: três personagens verdadeiramente conhecidos da cidade e, em função disso, habitam, com violento vigor, nosso imaginário coletivo. Aos três dedico meu texto neste domingo.

Um comentário:

  1. Caro Mozart
    cresci em Uberaba e hoje vivo no RS. no 1o grau, tive uma professora de história no colégio Castelo branco, chamada Teresinha Maciotti, que dizia o mesmo que você: nossas ruas e peaças deveriam ter os nomes das pessoas da terra.
    Lembro desses que você citou e de outros três: o "Lampião" que ficava sentadfo nas escadarias do cine São Luís e corria atrás da criançada com um cajado imenso toda vez que era chamado pelo apelido; o "São Bento" que, dizem, ia e voltava a pé de Uberaba a Riberirão Preto (alusão ao nome da empresa de ônibus que fazia esse trajeto) e que, pelo que sei, morreu atropelado na rodovia; o "Comunista" que sempre usava uma camisa vermelha e perambulava pelo centro de Uberaba fazendo discursos inflamados porém ininteligíveis contra um sistema opressor (que vigorava naquela época).
    Foi bom rememorar essas criaturas especiais da minha infância.
    grande abraço.
    Parabéns pelo blog.
    Luiz Pantaleão

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